O 1.º de Maio nos dias de hoje: desafios e conquistas

Mai 6, 2024

O Dia Internacional do Trabalhador representa, em si, um conjunto de conquistas que são inqualificáveis para os dias de hoje. Teve o seu início em Chicago, em 1886, com reivindicações por parte dos trabalhadores, cujo objetivo era o de reduzir a carga horária de trabalho, diária, para as oito horas. Para nós, atualmente, este é um direito inquestionável.

Em Portugal, o dia é assinalado na sequência das lutas sindicais e laborais que se faziam sentir um pouco por todo o país, mas que só puderam ganhar o seu expoente máximo, com o fim da época salazarista, que veio culminar com a Revolução dos Cravos, que se comemorou há poucos dias. O 1.º de maio começa a ser instituído como feriado nacional no ano de 1975.

Mas, hoje, este dia deve levar-nos a refletir sobre as atuais condições e direitos de trabalho. Cada vez mais, é um tema de grande importância para as organizações e as entidades patronais devem estar atentas aos seus deveres enquanto protetores dos direitos dos seus colaboradores, bem como a novas tipologias contratuais que surgem como consequência dos novos modelos que são adotados pelas empresas. Um reflexo do que aqui falo é o trabalho híbrido, ou até mesmo a exclusividade do teletrabalho, que algumas empresas têm vindo adotar, principalmente no período pós pandemia.

Assim, a entidade empregadora tem, desde 2023, de contemplar as despesas adicionais que este tipo de trabalho acarreta, mas não só, também os direitos para os profissionais com filhos portadores de deficiência ou doença crónica têm contratos com tipologias diferentes, assim como o direito a trabalhar em tempo parcial para cuidadores informais, registam-se ainda alterações referentes à licença paternal, a licença para luto gestacional, a revisão das licenças por falecimento, alterações no âmbito dos contratos de trabalho temporários com limite de quatro renovações, entre tantas outras que trazem novos desafios para as organizações em função das necessidades do trabalhador.

Todas as alterações que vão sendo implementadas/modificadas anualmente têm como principal função motivar os colaboradores, transmitir-lhes confiança, junto das organizações para as quais trabalham. Estas medidas vêm na sequência dos objetivos de combater contratos precários, permitir condições condignas aos trabalhadores e, sobretudo, algo que cada vez é mais debatido, permitir o denominado work-life balance.

Este novo conceito é cada vez mais valorizado em Portugal e no mundo. Segundo o estudo da Workmonitor – The Voice of Employess 2024, que foi realizado por empresas especialistas no mercado de trabalho em 35 geografias dispares, entre a Europa, Ásia e América, que revela no caso em particular dos portugueses e das portuguesas, indo ao encontro das restantes tendências mundiais, cada vez mais damos uma maior preponderância ao equilíbrio estável entre a vida pessoal e profissional face ao salário mais elevado e a uma progressão na carreira.

Neste estudo são ainda mencionados os 5 fatores considerados fundamentais no emprego, nomeadamente: o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional (97%); o salário (96%), o apoio à saúde mental (94%); a segurança no emprego (93%); flexibilidade no trabalho; e oportunidades de carreira (88%).

As portuguesas e os portugueses estão preocupados em equilibrar a sua vida profissional e pessoal e exigem contratos e empresas que tenham em conta estas considerações. A sociedade está a mudar a um ritmo avassalador e tal exige um acompanhamento da lei a latere.

Outro das temáticas que não poderia deixar de abordar, face ao trabalho que desenvolvo diariamente nas minhas organizações, é a evolução das mulheres no mundo laboral e a forma como se têm afirmado em muitos setores, que até então, eram da exclusividade dos homens. Continua a ser hediondo, quando no século XXI continuamos a depararmo-nos com ideologias retrógradas e misóginas. Durante anos as mulheres lutaram contra uma sociedade que as consignou a papéis minoritários, enquanto meras cuidadoras do lar e das suas famílias, sofreram e sofrem discriminações de género e continuam a ter imensas dificuldades no acesso ao mercado de trabalho e a posições de chefia, como já o comprovei através de dados quantitativos, em diversos artigos que tenho vindo a desenvolver.

Embora o princípio da igualdade de remuneração por trabalho igual tenha sido introduzido no Tratado de Roma (1957), ainda persistem por toda a Europa desigualdades salariais. Em Portugal, a diferença média de remuneração entre homens e mulheres, no ano de 2021, foi de 11,4%. Nesse mesmo ano a Estónia era o país com maior diferença salarial, representando 20,5%, e o país europeu com menor diferença era a Roménia, com uma taxa de 3,6%.1

Estes dados têm de ser analisados à luz de uma série de fatores externos que os influenciam diretamente. Existem ainda muitas mulheres que executam tarefas que não são remuneradas, tarefas afetas ao cuidado dos filhos e domésticas. Segundo os dados de 2022, avançados pela Eurostat, 28% das mulheres na UE trabalha a tempo parcial contra 8% dos homens, no entanto, quando o trabalho remunerado e não remunerado for tido em conta, as mulheres por semana trabalham mais horas do que os homens. Verifica-se ainda que em vários países da UE têm ainda instituído culturalmente a pausa na carreira por parte das mulheres para se dedicarem aos seus filhos e a outras responsabilidades da vida familiar a tempo integral, tal não é tão habitual para o sexo masculino.

Os salários mais baixos que predominam junto do sexo feminino podem ser explicados pelo facto de muitas mulheres estarem em setores cujos salários são inexoravelmente inferiores, ou devido a haver menos mulheres em posições de chefias, e as que estão a exercer estes cargos apresentam salários, quando comparados ao dos homens, inferiores. Segundo os dados avançados pela Comissão Europeia, as mulheres ganham 23% menos, por hora, em cargos de gestão, quando comparadas a um elemento do sexo masculino que se encontre na mesma posição e a exercer as mesmas funções.

Ao longo dos últimos anos têm vindo a existir uma série de medidas por parte da UE, e dos países membros, que visam unificar estas discrepância salarias latentes, mas neste, e em outros temas, ainda muito há por fazer. Nas minhas empresas, além de ter maioritariamente mulheres em cargos de gestão, os homens que ocupam os mesmos cargos, recebem o mesmo valor por hora do que as mulheres. Só assim faz sentido, para mim, gerir as minhas organizações, promovendo os mesmos direitos salariais entre homens e mulheres e dando as mesmas oportunidades no concerne à progressão de carreira.

Neste 1.º de maio, quero ainda deixar como reflexão a importância do nosso trabalho estar alinhado com os nossos objetivos pessoais e que vá ao encontro daquilo em que acreditamos e nos revemos. Nós somos um conjunto de coisas, nomeadamente, nós também somos o nosso trabalho e, por isso, é essencial que esteja alinhado com o nosso propósito. O seu sucesso advém do propósito e da energia que nele colocamos. E por isso, devemos estar em empresas que estejam de acordo com os nossos valores, ambições e onde nos sentimos valorizados. Quero, por isso, parabenizar todas e todos os trabalhadores deste país que contribuem diariamente para fazer de Portugal aquilo que ele é hoje, onde todos os cargos e funções são importantes para o nosso propósito comum, o de nos tornarmos num país mais competitivo, que retém talento e que prima pela diferença. Estamos no caminho certo, mas deixo o repto de que ainda há uma longa caminhada por trilhar!

Artigo publicado pelo Link to Leaders a 06/05/2024.

Parlamento Europeu. (2023, 04 de abril). Perceber as disparidades salariais entre homens e mulheres: definição e causas. Temas Parlamento Europeu. Consultado a 15 de abril de 2024.

Notas bibliográficas:
Lusa. (2023, 01 de maio). Dia do Trabalhador comemora-se em vários pontos do país. SIC Notícias.
Varandas, Sandra. (2023, 30 de abril). O que muda no mercado de trabalho a partir de 1 de maio. SIC Notícias.
Peralta, H. (2024, 23 de janeiro). Work-life Balance: 60% dos portugueses dizem ser esta a prioridade ao aceitar um emprego. Forbes Portugal.
Parlamento Europeu. (2023, 04 de abril). Perceber as disparidades salariais entre homens e mulheres: definição e causas. Temas Parlamento Europeu.
Eurostat Statistics Explained. (2019, setembro). Reconciliation of work and family life – statistics.
Lecerf, M. (2023, junho). Equal pay for equal work between men and women Pay transparency and enforcement mechanisms. European Parliamentary Research Service.

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